segunda-feira, 28 de maio de 2012

nota final

A solidão leva ao desespero. Sempre acompanhada de silêncio, dos demónios que gritam nos confins da alma, de memórias que apenas deveriam ser isso mesmo.

A vida vai sempre torta, apesar da falta de laranjas e de uma encosta de onde se veja uma marina lá num desses países onde querem que seja proibido ser feliz.

Arturo e Flor, os demónios e os anjos escondidos no fundo das almas que nem tempo têm para se perder. Podia ser uma história real se tivéssemos a capacidade de usar as capacidades cerebrais na sua plenitude, ainda assim é realidade para quem queira fazer dela a sua.

'O ofício do silêncio' que comecei a escrever em 2010 a.C., sairá como livro, com apresentação pública numa das paredes que delimitam este universo, lá onde Arturo viaja com Flor em busca de um amor cósmico, sem se preocuparem com a falta de oxigénio.

Haja dinheiro no meu bolso que possa dispensar para essa missão, que poucas coisas mais me realizam!


Manuel Marques
28-05-2012

sábado, 26 de maio de 2012

150 flores de devastado amor


A cabeça latejou até ao último instante. Mais do que uma dor, um absurdo silêncio que ninguém entendia, porque era ensurdecedor.

As pessoas tendem a fugir das complicadas teias de quem foge à ideia de normalidade que lhes enfiaram na cabeça.

A cabeça teve de rebentar e foi um dia de muita chuva, um calor insuportável, uma humidade propícia a infecções sazonais cada vez mais intensas. Teria sido melhor o verdadeiro fim do mundo, por mais associal que pudesse parecer. Rebentou e provocou apenas estragos nele, que ficou irreconhecível perante a importância que teve para com o mundo, que nunca reconheceu essa história de passar entre dimensões. Paralela só a rua onde havia uma bica divinal, de alguém que vivia feliz na solidão de muitas flores, pardais que lhe iam comer à mão sem que lhes pudesse tocar. Nada mais podia parecer perto da felicidade.

E no mais sepulcral dos silêncios entoou-se um instrumental que evocava guerras de ninguém. Era o tempo certo para espantar os assombros de uma antiguidade não muito distante.

Quase no fim e as pessoas que viviam no quarto das cortinas vermelhas eram frequentemente incomodadas por vizinhos insatisfeitos do barulho excitatório. Apenas o fim sem que o mundo passasse a ser um jardim encantado onde Flor e todos os peregrinos dançassem até que o rabo passasse a ter vontade própria e se movesse ao som de qualquer coisa quente no ritmo e suas consequências hormonais.

As guerras voltavam a ser a sina de alguém e os humanos passavam de novo a destruir o planeta que os acolhia. Adiara-se o inevitável, por via do delírio.

As pessoas iam passando enquanto na sala quase negra de atitude o fantasma pairava sobre o corpo massacrado de tanta viagem inter-dimensional.

Era apenas uma forma diferente de buscar os objectivos, cumprir sonhos malditos e alinhavar aquelas desgraças anunciadas que quase sempre eram um bluff, nem sempre tão misterioso como a doentia mania da exclusividade que alguns tinham.

Lembrou-se que tinha mais liberdade que antes, que as alucinações e a aparente falta de sentido das coisas eram apenas a normalidade do seu dia-a-dia. Não havia fórmula matemática que pudesse resolver essa questão. Os olhos recebiam sempre os estímulos necessários para agir em conformidade com a salvação do mundo quando voltasse a ser necessário. Deixara de se preocupar com as aparências ou com o que pudessem pensar das suas excentricidades.


FIM.

149 no ácido dos dias


Ainda soavam com força os versos do poeta enquanto homem, do deserto enquanto vida, da erva enquanto negligência para a continuação.

Apenas passar os dias junto de algum ser admirável, sem que as lágrimas tivessem de dominar, era a meta a atingir.

Uma nação inteira de zombies que nem queriam comer-lhe o cérebro, algo de muito frustrante. Os dias passados em mentiras sem que fosse permitido alcançar o desejo, era algo que apenas o afligia a ele. Os peregrinos da sagrada loucura haviam assentado e como em todas as fés e sobressaltos pela qualidade de vida, começavam a esquecer o motivo que os havia levado a fazer o que haviam feito.

A terra prometida era apenas uma aparência e as lágrimas banidas voltavam a manifestar-se, porventura por alegria, ainda mais pela tristeza no ácido dos dias de Céu azul.

Jesus ia regressar à Terra, para finalmente colocar em prática todo o amor que havia sido negado em tempos primitivos. Afinal parecia que a história se repetiria e em vez de Pilatos a lavar as mãos eternamente imundas ter-se-ia uma sondagem feita em dia de calor intenso, convidativo para a praia e para o desleixo perante os deveres primários.

Apenas uma obsessão pela terra prometida, pelas receitas infalíveis de desejo. Ah sim! Era por demais importante ter o desejo acima da própria auto-estima e até parecia fácil.

A malta juntou-se numa trip alucinada e enviou as maleitas próprias por um cancro abaixo, fazendo renascer a força de vontade no meio de um desespero sem igual. É apenas claro que não podia existir um divórcio declarado entre as ideias e as negociatas próprias, antes incentivar a necessidade de deixar de dar nas vistas, enquanto alguns se pautavam pela segurança.

Dentro da cabeça e olhos tristes apenas uma lágrima furtiva que caíra sem provocar danos irreparáveis em nada importante.

Juntavam-se alguns violoncelos mágicos e guitarras eléctricas da ponte que separa as terras do desejo e as meninas que por lá habitavam apenas excitavam os rapazes com o melhor que tinham de si mesmas, tudo para evitar o ácido corrosivo dos dias. Apenas era necessário ver as horas, pegar nas armas do absurdo e aproveitar cada momento antes que a morte interrompesse esse fluxo de prazer.

148 na penumbra de uma sala


Houve um dia em que todos se juntaram na penumbra de uma sala. Na televisão antiga, a preto e branco, José Agostinho Baptista dava uma entrevista a uma jornalista antiga acerca do seu novo livro ‘Biografia’. Os presentes pareciam não se dar conta que cada recanto daquele sítio era preenchido com retalhos de almas danadas. Quase todas, que alguns permaneciam estáticos junto a uma chávena de café da qual saíam sons de balões cheios de água a esfregarem-se freneticamente contra cordas gastas de uma ainda mais antiga guitarra portuguesa. Não havia lugar a meros humanos, apenas a esperar, pela eternidade se preciso, a penar pela chegada do decifrador-mor dos enigmas sem solução.

É claro que a eternidade não era algo inalcançável e depressa se depararam os 3 donos das almas mais ou menos imundas que viajavam inquietas por corpos com vida pelo mero infinito enquanto não eram convocados para dar sentido a um novo corpo.
Como se podia desejar o Céu se não havia lugar aos pecados apetecíveis? Como se podia querer o Inferno se apenas se teria o sofrimento repetido até à náusea, o desconforto das trevas eternas? Como se podia querer perecer no limbo dos que, insonsos, passaram a vida de cabeça baixa à espera da sorte no meio do desnorte?

Na penumbra de uma sala depois da presença física de José Agostinho Baptista e pedaços da terra natal junto do coração do poeta, os 3 deambularam pela antiga amizade que os unia, nascida do ventre da Mãe de todos eles. Viajaram ainda na recíproca tentação de se evidenciarem pela desgraça, pelas línguas que, debitando silêncio, se sujavam com o desprazer pela prática necessária de actos que levavam a uma morte dolorosa e lenta, a uma entoação épica de letras encadeadas em palavras comuns que, juntas, formavam a perdição final.

Lá ao longe, num sítio um pouco menos negro, um italiano tresloucado assumia o papel de animador num espectáculo de angústia e cor, que convidava os eleitos a juntarem-se-lhe na demanda pela orgia mais excitante de palavras de todos os malignos e descuidados tempos de hipocrisia.

147 madrugadas de ciúme


No dia da grande mudança deu-se uma crise violentíssima de ciúmes entre Arturo e Flor. Não era negócio de Deus ou artimanha de Lúcifer, apenas a estúpida sensação de andar com um valente par de cornos entre Universos. Foi assim que se provocou a fractura decisiva entre génios especiais que se amavam até à morte se fosse necessário. Só que nessa noite não houve desejo, apenas a explosão a que nunca se deu a devida atenção apesar dos sinais. Dir-se-ia que felizmente amuaram e que nenhum dos outros 70 teve parte activa na convulsão irreversível que encostou os princípios adquiridos e consolidados ao longo de séculos, a um abismo em que piranhas ávidas de destruição, esperavam pela sucinta estupidez dos que iam ser aniquilados.

Flor assoberbou-se no auge da madrugada, as lágrimas que verteu eram de fúria pura e os maremotos sucederam-se, as vagas gigantes irromperam imponentes no Pacífico, enquanto Arturo pagava a sua louca crise de ciúmes abrindo crateras onde caía consecutivamente até um dos Infernos onde amiúde ia. A busca pela ansiedade serenidade ficaria para os dias mais alegres, era antes tempo de definir o que mais interessava e isso implicava uma antipatia que desesperava quem necessitava de resultados a modos que instantâneos.

A convulsão deu-se às 3 da madrugada. Os deuses sem imortalidade e os demónios sem maldição foram sendo engolidos pela sua própria insignificância. Os silêncios deixavam de ser ensurdecedores e os autos-de-fé sucessivos iam apagando o desgosto crescente da Mãe Natureza, assim feminina, personificada em Flor.

Evaporara-se a existência sem alarido de muitos zombies com uma ventania de ar sujo nas suas cabeças mais ou menos bonitas. A merda das aparências, do fluxo de alarvidades tidos como coisa normal, fora-se. Se era em definitivo, é provável que não, que o simples facto de se ser humano era sempre um potencial atentado àquilo que o rodeia, seja fundado ou não, seja pelos malditos ciúmes ou apenas pela sempre normal inveja do sucesso alheio.

146 comércio de embriaguez


Contemplar a dor de corno dos superiores é um dos espectáculos mais gratificantes que se possa imaginar. Os loucos estão sempre além dessa ninharia mas os simples, aqueles que sempre algum grau de animosidade perante os invejosos que os rodeiam alcança um pequeno grau de felicidade quando assim acontece. Apenas há que lutar por outra forma de estar na vida que não a de vibrar com as derrotas dos outros.

O dinheiro dos vis não é tudo na vida, às vezes vale bem a pena sair da toca nos momentos de maior crise e ir em busca de uns dias diferentes. Se tudo acabar na desgraça anunciada sempre se pode desaparecer que o mundo nem dará pela falta de tal louco.

É urgente ser louco, vibrar entre cada momento de embriaguez mental, como se o agora fosse uma excitação descomunal.

Então porque é que afloro essa infinita tristeza de gente que se compraz em desgraças desejadas, na mais pequena ponta de felicidade de um pequeno alguém? Não sou Deus, nem frequento a caverna de Lúcifer, apenas luto pela dignidade de quem quer ser independente. Não é para todos, não é um desígnio, nem sequer nasce com a pessoa, é apenas algo que vai crescendo com os estímulos adequados. Algo que antes era abruptamente recriminado em nome da manutenção dos bons costumes, da evolução de um mundo podre em que nos embriagaram até à inconsciência, vendendo a parte oposta a quem se dedicava ao consumo das energias poderosas, os vis déspotas que hoje sofrem as amarguras dos seus pecados sem graça, tesão ou mero desejo.

Amanhecer é sempre uma festa. A própria Morte já não se chora apesar de manter o seu caminho de sempre. O imprevisto faz rir e chorar, nem sequer imaginei que pudesse ser de outra maneira. Nem Bem, nem Mal, apenas uma saudável antítese dessa bebedeira de sinais. Apenas um mísero fim sem meios atordoantes. E se Jesus fosse de carne e osso estou certo que me juntaria à sua tribo. Os homens gananciosos com que se deparava jamais poderiam fazer da sua pura doutrina de amor uma guerra sem quartel queimando vivos os descrentes, envenenando ainda mais os fiéis perseguidores de mitos.