domingo, 5 de setembro de 2010

038 um sítio para o esquecimento

Algo brilhava com uma intensidade superior à normal, como se se manifestassem de forma abrupta algumas das mais nefastas consequências do aquecimento global. 

Era apenas um dia de Sol, raios intensos a perfurar a atmosfera mais que o normal e alguns seres a sofrerem queimaduras quase instantâneas, motivadas por algum colapso na camada de ozono. Porém tudo era provisório, tal e qual como o mundo daqui a muitos milhões de anos será engolido pela expansão final do Sol, que porá um ponto final a toda a fantochada criada pelos humanos para dominar o planeta Terra. Claro que, como nesse presente, as mentes mais prodigiosas e sobretudo as mais endinheiradas, já estariam a anos-luz da omnipresente desgraça que a todos aflige.

Apesar de por vezes sorrir perante os cenários da desgraça, eram mais as vezes em que sentia algo maligno crescer dentro do seu ser e os comprimidos para a depressão daí advinda o perfeito bálsamo para o esquecimento de um mundo em busca de super-humanos que o salvassem com o plano certo.

Havia que encontrar o sítio certo para substituir os pesadelos recorrentes por um qualquer ente iluminado pelas energias positivas, algo que sentia com pouca intensidade. A vida não lhe sorria de feição e o mundo mostrava-se algo mais violento e propício ao colapso nas formas de vida.

Foi na deambulação pelos recantos mais sujos da sua existência que se deu conta da sua solidão, vivida numa grande metrópole apinhada de potenciais suicidas que conduziam a falta de desejo ao seu Apocalipse final.

Para ultrapassar esta amargura e impedir a formação de metástases que lhe minariam toda a auto-estima permitiu-se desligar por instantes o contacto à Terra, viajando muito para lá da fina camada de gelo que se havia criado entre si e uma suposta vida normal.

Transformou-se a história de alguém sem interesse num monstro de contornos mitológicos, pela fama adquirida e pelos anos intensos de viagens rumo a um sítio para o esquecimento, o que lhe estava vedado por via da sobre-exposição a que estava sujeito. Desta maneira era impossível arquitectar planos de fuga física, deixando o povo incrédulo a chorar pela revelação ad eternum das mesmas tentações que há muito recebiam como novidades arrepiantes.

Nesta dimensão paralela de soberba foi-lhe dado a conhecer o Rei de todos os Reis do qual, naturalmente, não se lembrava nem da cara nem da possível metamorfose necessária para ser visível por um mero humano por mais famoso que este fosse. Já era hora de abreviar caminho até à glória, mesmo que isso não passasse de mera ilusão.

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