quarta-feira, 19 de maio de 2010

017 noites de temporal

Os dias passavam, consecutivamente com planos de um futuro não muito exigente, em que algumas decisões simples se encavalitavam numa suposta liberdade de movimentos que impediam a concretização de outros sonhos, tornando a realidade uma confusão para os sentidos, ainda jovens, gastos de tanta decepção.

As noites nem sempre foram de pesadelos, algumas vezes, talvez na adolescência, sujava os lençóis depois de copular com as mulheres nos seus sonhos. Isto acontecia-lhe quando ainda era virgem e os trovões apenas lhe tornavam o sono mais pesado. A confusão de sentimentos tinha destas coisas insanas, eram mulheres que lhe devoravam o sexo, mesmo sem cara, o desejo dos seus corpos apenas imaginado e depois nem eram precisas as revistas feitas a pensar em sessões contínuas de masturbação, jovens entesoados com borbulhas mal espremidas, desviados da suposta normalidade, que cada vez menos o é.

Era possível que em noites de temporal todos sonhassem com corpos femininos e que encostado aos seus pensamentos estivesse sexo a queimar o seu próprio sexo. Houvera sido educado quase na ignorância e o sub-consciente pregava-lhe estas partidas. Claro que as mulheres sonhariam com os homens, mas um casal de ambos os sexos só é coisa normal no reino animal para fim exclusivo de reprodução, nos humanos parecia que tinha deixado de fazer sentido.

Por maior que fosse a cama havia sempre um qualquer problema em aceitar a solidão, uma tentativa de aceitar que aquela maldição de vir a passar os dias consigo mesmo o levasse para dentro do manicómio, cujo parque de estacionamento conhecia tão bem. Lá dentro ter-lhe-iam dado as substâncias químicas adequadas para depois se passear semi-nu pelas ruas mais próximas e ser alvo da chacota dos loucos sem prescrição.

A pressão tem destas coisas, porque afastar-se da namorada o levava para as trevas profundas de onde só poderia sair um homem mais atormentado.

Sabia-lhe bem aquela espécie de rotina que tinha com as filhas dela. algo que diziam ser errado apenas porque o pai verdadeiro pertencia àquela estirpe de homens cuja palavra demolidora valia sempre mais que a ausência de actos concretos. Quem lhe dizia essas coisas não podia saber do desejo que se consumia e lhe destruía uma alma que já tivera outras tempestades furiosas, sempre em encarnações passadas. Se acreditasse em Deus decerto que nesta teria muito que se confessar, pela inércia e orgulho que lhe consumiam o bom-senso sem que que se apercebesse da pulsão suicidária que se libertava do medo que a amarrara anos a fio.

Em noites de temporal lembrava-se de abraçar com força uma mulher que já nem era memória.

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