quinta-feira, 17 de novembro de 2011

121 delírio e secura


‘Condicionamos a vida em função do que os outros querem, tendo preparado no passado tudo o que precisamos para viver amordaçados no presente e apodrecer lentamente no futuro incerto’. Passava-lhe muito isto pela cabeça, como se fosse um remoinho de orgasmos frustrados, estimulados quase até ao limite, desprezados no zénite da sua existência plena do prazer físico necessário.

Sim, era como um crime, tanto delírio como secura na fronte dos humanos mumificados em vida e ao mesmo tempo apenas era necessário salvá-los deles próprios.

Nem Deus, nem Lúcifer, apenas um profano sedutor que corrompia as ideias feitas que levavam as pessoas por trevas insensatas.

Mas será que alguém no seu perfeito juízo tinha alguma hipótese de salvação com as coisas naquele estado? O que cada vez mais tinha como assente era a cultura do silêncio, a erradicação das ervas daninhas repletas de amargura e decepção, saber que na verdade vivia num mundo em que a superioridade de cada um era uma doença mental gravíssima, porque não assumida como tal. Tudo se constituía como uma enorme sombra envolta num nevoeiro onde só restava ser impossível, com as terríveis consequências que, fatalmente, viriam daí.

Não raras vezes ia para a cama como os olhos cansados dos dias iguais. Se pensava vinha sempre mais do mesmo.

Podiam ser tempos de crise, mas a da vontade interrompia-lhe a contemplação das obras em que o cérebro se embrenhava até se perder num labirinto de pensamentos iguais, torturas sempre indigentes.

Tantos eram os dias sem princípio meio ou fim que se perdia na noção exacta da loucura que ia buscando em cada recanto de alma que ainda fosse possível salvar.

Apenas olhar e sentir o que era preciso sentir, aceitando os motivos incompreensíveis da felicidade adquirida nas pequenas coisas que faziam girar cada mundo.

Apenas escutar, onde não havia som, nada de nada, fazendo nascer algo de absolutamente novo, parir um novo sentido existencial onde os pecados fossem banidos ainda antes da concepção. Apenas paz e sossego, evolução até nas derrotas, vibrar pelos sonhos apesar dos outros os tomarem como seus. As vitórias também são de fé e Arturo já estava demasiado familiarizado com o Inferno.

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