sábado, 3 de abril de 2010

005 antes da destruição

A moça tinha formas que convidavam aos piropos.

Um árabe assim educado, assim ludibriado disse algumas coisas na sua língua. A moça pediu-lhe com toda a indelicadeza possível que falasse na língua dela, vociferou o famoso nome contra a mãe, que leva sempre com as culpas todas, e o dito excitado meteu o rabinho entre as pernas e pôs-se a andar. Deu para sorrir um pouco e o desejo de viajar para onde a forma de ser de cada um nem precisasse de palavras se acentuasse.

Era por demais evidente que um dia o sangue jorraria e nem haveria diferença em relação às cortinas vermelhas que escondem outros árabes, convidando ao silêncio provocado por uma ausência angustiada de imaginação. Talvez o árabe pensasse que a forma como fora educado lhe permitisse obliterar o amor-próprio de todas as mulheres que visse por aí.

Entretanto conjecturavam-se planos para que os roubos que se avizinhavam se tornassem uma realidade e os governantes ganhassem algum tipo de vergonha na cara, no que dizia respeito aos seus desvios qualificados de dinheiro, que deixavam de poder ser utilizados em reformas quase sempre miseráveis, quase sempre de vidas, quase inteiras, de uma dedicação mais do que servil.

O vulto de formas perfeitas não era mais do que a filha da namorada por quem se dispunha a danificar o corpo de outrém sem que alguma investigação viesse a comprovar ser ele o culpado de alguma coisa.

Dirigiu-se à janela e acendeu um cigarro. Lá em baixo dois polícias algemavam um alcoólico amargurado com a perda de uma mulher que entretanto seguia numa outra rua ali perto, vestindo uma camisa com gola alta a tapar algumas nódoas negras. Dir-se-ia de amor, porque a educação de muitos apenas é exprimida com toda a força possível. Gente com o sangue permanentemente minado de álcool barato.

Em frente apenas janelas fechadas e uma intrincada teia de fios telefónicos que entupiam algumas linhas S.O.S., não sendo mera coincidência o aumento das forças policiais na zona. Talvez a intenção de repôr alguma identidade cultural fosse um motivo que os levasse a insistir naquela rua em particular, ou então alguém teria visto com bons olhos começar a salvação da humanidade naquele beco sujo, antes da destruição das almas impuras, que ao renascer depressa aprenderiam o vil tormento da destruição maciça do planeta.

Entretanto da rua via-se um vulto junto à janela da cortina vermelha.

4 comentários:

  1. Olá Manuel! Fico feliz com seu retorno à "blogosfera". Parabéns pelo blog e talento singular que o norteia sempre. Beijo e sucesso! Renataemessencia

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  2. Só para lembrar que te acompanho sempre, mesmo que em silêncio.
    Você está ótimo nesse recomeço.
    Como sempre, não poderia ser menos.
    Poemas? lúdicos! sensuais! maravilhosos!
    Vou poder ler quando?
    um grande beijo deste lado do Atlântico
    saudade
    Yasmim

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  3. fico imensamente feliz com estes dois comentários... espero não desiludir ninguém com as minhas loucuras literárias!

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  4. para a yasmim... deixei de escrever poemas assim... mas quem sabe um dia volto a destilar essa sensualidade de que falas!

    beijinhos e decerto que és uma mãe realizada!!!

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