domingo, 28 de novembro de 2010

049 que farei deste silêncio?

Depois do banho tirou um cigarro e foi para a varanda, estava frio e chovia. À parte disso um silêncio sepulcral entre-cortado por uma ligeira brisa. Nada de estranho à vista e pôs-se a pensar em toda aquela confusão, como se não lhe bastasse o fracasso que estava a ser a sua adaptação a um meio ambiente que sentira o ideal para viver os seus últimos dias, fossem lá eles quando fossem. Não tinha com quem falar, era de noite, dia da semana e ninguém tinha tempo ou disposição para ouvir loucuras. Colocou a possibilidade de ir ao hospital mas rapidamente a abandonou apesar da fortíssima dor de cabeça. Voltou para dentro e tomou um comprimido para as dores enquanto fazia algo para comer. Passados 20 minutos estava em frente ao computador e a comer massa com queijo. Abrira também uma garrafa de vinho e bebia directamente pelo gargalo. É possível que na manhã seguinte nem se conseguisse levantar, mas tudo lhe soube muito bem e resolveu vestir-se para ir à rua. Apetecia-lhe o contacto com a chuva e andar, algo que fazia cada vez menos, mas fê-lo e não passou muito tempo até ter os pés assentes na calçada molhada. Sentia-se meio a cambalear, possivelmente a melhor ideia seria dormir outra vez, mas tinha que caminhar, descobrir o porquê daquele súbito silêncio que se apoderara dos projectos que tinha para a sua vida, da falta de vontade que tinha em ver de novo a montanha e inspirar-se com a sua majestosa presença, mas acima de tudo entender o porquê de ter que fazer um favor aos que o amavam, de se manter vivo. Era um fardo que começava a tornar-se demasiado pesado.

Após uma hora a andar e sabendo que já estava longe de casa resolveu parar, sentou-se num banco molhado, como os seus olhos já estavam à muito tempo. Se depois não tomasse as devidas precauções viria uma daquelas gripes loucas com consequências imprevisíveis. Logo se levantou tendo o silêncio como companhia. Seguiu pelas ruas desertas da cidade pequena, sentindo-se observado mas não vendo ninguém que desse substância aos seus temores. Sem ser um homem crente ou influenciável algo de muito forte se apoderou do seu sub-consciente, apressando-lhe o passo até à rua onde se via o apartamento das cortinas vermelhas. Por um instante pensou para si mesmo que até a alma venderia ao diabo se daí viesse a paz que lhe faltava.

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