quinta-feira, 23 de junho de 2011

083 é tarde no teu rosto

Uma e outra vez tentava pensar em como lidar com os sonhos brutais que o acompanhavam no seu dia-a-dia vulgar, mas esbarrava sempre na tardia forma de um rosto que tinha de invulgar o sorriso desinteressado. Ainda assim era sempre tarde para alcançar qualquer tipo de zénite, pelo que se dedicava antes ao jogo, fosse virtual ou mesmo antes de qualquer coisa, a única forma de desviar os sentidos de um destino votado à indeiferença, como o de quase todos os que se glorificam com a glória alheia, com a auto-estima alimentada por banalidades, como ser fã de alguém que apenas tinha lançado o último êxito musical, pronto a mascar, ainda mais rápido a cuspir para qualquer lado e a ter destino igual ao da memória que ficaria de quem o expulsasse da sua boca. Estes e outros considerandos obrigavam-no a desviar as atenções da sua vontade de aniquilar as farsas de que se alimentavam os donos do mundo. Tal como nos seus sonhos, onde tinha poder ilimitado e agia em conformidade com essa realidade, era um pragmático, um maníaco consciente até ao mais ínfimo pormenor das suas limitações físicas, sem paralelo com a sua vontade de mudar o seu mundo. É evidente que estava à vista a resposta para a solução final, mas as pessoas olhavam sempre em direcções erradas, voltando à realidade quando os desejos já estavam trancados no cofre inacessível de alguns poderosos. Claro que esta falta de sentido de oportunidades só podia causar infelicidade. A solução de Arturo era fechar os olhos, acreditar que a realidade era a implantação da Sagrada Loucura, que o Bem e o Mal jamais seriam um pretexto para dominar os mais fracos, que os 72 em conjunto seriam a prova que nada interferiria nessa nova harmonia, feita de actos atempados, em horas próprias para o amor se declarar e as expressões faciais se soltarem, anunciando novos dias.

Ao abrir os olhos, apenas sobrou a crença num destino novo. se assim era e a revolução era para ser feita de pés bem assentes no chão, então já não desesperaria pelo regresso do ansiado narcótico. O vício por acreditar na vida devia ter a paga correspondente no avolumar de pistas que levassem ao caminho que por sua vez leva à felicidade.

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