quinta-feira, 25 de agosto de 2011

111 no rumor destas casas

As ruas esvaziaram-se, como se as almas se tivessem entendido e se escondessem dentro das casas a vibrar dos pecados sujos de cada uma. Algures no planeta algumas dessas almas juntavam-se com os seus invólucros para lançar de novo o caos.

Sem a mais pequena ponta de remoroso por não estar a lutar pela salvação do mundo, zelando pelo equílibrio entre dimensões, Arturo sentou-se em frente ao portátil enquanto procurava o conforto de alguma mensagem obtusa, amor assolapado ou vídeo para sorrir de alguma desgraça desembutida da imaginação natural de algum génio. Sim, ele tinha os seus ídolos, sem ter pés de barro ou permitir-se à humulhação dos rumores infundados transmitidos pelos inúteis do costume.

No rumor destas casas as almas ainda por perder adensavam a vontade de enegrecer quem fosse contra a necessidade de voar sem sair do mesmo sítio.

Arturo apenas teclava furiosamente as simples tentações a que um homem não tem que fugir. Nem sequer pensava em Flor ou na vida que queria ter com ela, longe das dimensões fantásticas que apenas serviam para acentuar os desiquilíbrios entre as forças cósmicas ou a decisiva importância de um átomo desgovernado.

Numa noite atípica pensou, sentou-se em frente à televisão enquanto o cão de uma vizinha uivava cada vez mais alto. Estava preso em arames enquanto a velha dona fodia com jovens recém-casados para poder manter a casa. Era um espécime nojento que haveria de liquidar quando pudesse. O cão não tinha culpa, nem Arturo tinha tinha a cabeça suficientemente fresca para saber que com um mero estalar de dedos podia fazer desaparecer da face da Terra aquelas aberrações andantes. Por vezes sentia-se definhar no meio de um conceito diferente da vontade de amor e sobretudo sentir que era sublimada pelos sentidos apurados, subjugando a líbido e amputando a possível harmonia visível em pequenos artefactos, que mais não eram que a felicidade, quase sempre utópica, uma espécie de Mar Vermelho sem passagem para os justos, a morte e o desespero.

Olhava para o relógio do seu coração tentando adivinhar quando lhe chegaria o verdadeiro cansaço. Por enquanto a felicidade resumia-se a amar Flor entre montanhas de loucos sem interesse por nada.

Olhava de frente para a televisão enquanto explodia mais um reactor nuclear. Apenas uma vítima da falta de arrefecimento adequado, que os envolventes iriam pagar bem caro com o corpo.

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