quarta-feira, 16 de maio de 2012

131 a impressão de um beijo


Quis enfraquecer as noções do divino e do demónio. Aproveitar as desgraças alheias para absorver almas inoperantes. Desgastada a noção de fantasia caíam abruptamente na realidade e chafurdavam numa merda de cor ligeiramente menos repugnante. Tudo se desvanecia com a impressão violenta que lhe ficava dos beijos ardentes que lhe devolviam a sanidade mental, a vontade de sorrir e de enfrentar os furacões impostos por uma vida carregada de fantasias podres.

O enigma deixara de o ser. Havia que aproveitar a força brutal que lhes faria destruir toda a energia negativa imposta pelos preconceitos inculcados ao longo de toda a existência humana. No fundo eram humanos e muitos erros seriam cometidos. Aproveitaram uma pequena distracção de meros milésimos de segundo e praticaram sexo tântrico, que durou o equivalente a uma vida inteira de um simples terráqueo. A isto chamavam evolução. Na realidade era saciar o corpo, libertando-o da brutal estupidez imposta pelas sucessivas restrições à busca da felicidade. Já nem se tratava de alcançá-la, a simples busca estava prestes a ser considerada um crime.

O cansaço já dominava Arturo, para quem dias sem justificação dos actos praticados não passavam de uma mera utopia, enquanto que ter a boca seca e esquecida do sabor de um beijo mais parecia uma anedota em vez do castigo.

A fuga para o destino final começou a desenhar-se com a absorção da energia extra-terrestre por parte de cada um dos 72 peregrinos. Em partes desiguais, consoante a real importância de cada um.

Uma melodia soltou-se da terra molhada trazendo o seu cheiro característico às narinas de Arturo. Ao entranhar-se no sangue tomou conta do hospedeiro e professava algo acerca de umas memórias distantes que não podiam encaixar-se num vazio para além da simples compreensão e do sexo desenfreado que costumava vir acompanhado de algumas dondocas que para nada mais servem do que bambolear os seus efémeros atributos físicos.

A melodia teimava em não saber distinguir vontades e jogadas humanas de simples investimento num meio ambiente saudável. E tocava cada vez mais nas maldições intrínsecas de cada um, para gáudio da igualmente intrínseca insensibilidade de Lúcifer às mais básicas necessidades humanas.

Se tudo parecia ser um castigo, haviam os mais profundos e maléficos para decifrar. O que mais castigava Arturo era, no entanto a omnipresente saudade.

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