terça-feira, 22 de maio de 2012

137 no meio das sombras


E se não houvesse mais nada senão silêncio? A possibilidade de desbravar montanhas apenas para fugir aos cantos podres de pessoas de mal com a vida. Apenas viver sem ter medo de uma qualquer bala no coração ou sequer pensar que a floresta negra sem clareiras que é a ‘alma’ se iluminaria com a morte física.

No meio das sombras, o silêncio abrandaria as pulsões demoníacas que uma revelação poderia desnudar. A proposta irrecusável era a fuga. Fugir de quê? A liberdade era superior às fugas. Fugindo, a liberdade ficava fora de alcance e assim abreviava-se o fim de tudo, sina cíclica a que já ninguém dava importância. Quer dizer, Arturo buscava tudo o que eram contradições e conseguia ver no meio da multidão a única saída possível. A Morte. Via-a em cada recanto, já não conseguia escapar ao seu cheiro intenso, cheio do nada que se preenchia quase sempre com dor.

Andava perdido no meio de uma cidade qualquer, sem conhecer nomes, sem desbravar qualquer profecia que desse algum sentido à existência. Todos se pareciam com A Morte, mesmo os recém-nascidos, era uma espécie de epidemia.

As ruas estavam prostituídas da dor individual dos que satisfaziam alguns, que sempre se julgavam acima da mera vontade de viver uma vida normal. O sangue parara de correr nas veias.

A Morte em si andava por ali, aborrecida, ceifando almas ao desbarato, dominando novos conceitos que desde sempre foram alheios à sua essência. E Arturo olhava para a frente e sentia o amor como um ente perdido, o desenvolvimento das espécies como uma maldade do ente Criador.

E nada lhe escapava pela eternidade, mesmo as ruas e as almas por aí esquecidas depois de guerras implacáveis e sobretudo os sonhos utópicos.

Como há muito tempo não fazia, fechou os olhos, esperando uma vida sem viagens aos confins do Universo ou os Apocalipses em versão distinta da Bíblia cristã. Quando os reabriu estava dentro de um carro, uma mulher olhava-o com ternura e atrás um miúdo cantava algo ininteligível.

Quando desviou o olhar viu um rosto desfigurado, sorrindo e dizendo coisas sem nexo, terna, demasiado terna. Em frente, um emaranhado de curvas e contra-curvas e a velocidade ia aumentando.

- Cecília é o meu nome. Estamos juntos há tanto tempo e agora vens-me com essas perguntas?

E vomitava um grito lancinante, passando de repente para a parte de trás do carro enquanto o miúdo angélico mostrava os seus dentes podres

- Sou A Morte! Ahahahahahahahahahahahahahaha!!!!!!

E de repente entravam Atlântico adentro. Tudo terminava de repente, até as sombras.

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