Fruto da extrema ignorância da
maior parte dos humanos, o mundo fora sujeito a uma violenta descaracterização
que levaria à revolta antecipada de um Planeta com céu enganadoramente azul.
Em mais uma sessão de círculos
aéreos de uma precisão geométrica espontânea, os peregrinos encontraram o
momento exacto em que, na dimensão correcta, aconteceria o tal fim do mundo, à
imagem de Deus e inveja de Lúcifer. Esse acontecimento trágico, tantas vezes
anunciado, com contornos de macabra tentação em que por mais uns trocos se
alienavam vidas que apenas se arrastavam, às vezes felizes na pequenez dos seus
propósitos, e quem os podia censurar se daí não houvesse desgraças para os
semelhantes? Pois o tal acontecimento não destruiria tudo. A pulsão homicida da
humanidade haveria de ser sentida pelos sobreviventes, sem que daí pudessem
tirar qualquer tipo de proveito positivo no futuro mais imediato.
Arturo e os seus peregrinos,
assim pequeninos e sem importância aparente, desfizeram o círculo e partiram em
busca da salvação de quem entendiam merecê-la. Levá-los-iam até à montanha
mágica e no meio de um brutal Pipocalipse de miúdos traquinas e híper-activos
dar-lhes-iam a passagem para o mundo em que ser normal era um privilégio de
todos, sem que se sentissem as eternas cicatrizes de ter de prestar vassalagem
aos preconceitos da humanidade.
Demoraram pouco tempo a encontrar
quem queriam encontrar. Eram facilmente identificáveis os que se coadunavam com
os princípios da Sagrada Loucura e assim os absorviam, sem destruir os seus
corpos e acima de tudo sem danificar o potencial infinito das suas almas.
A cicatriz mais profunda não iria
desaparecer. Arturo levava consigo o martírio eterno dos desejos frustrados, a
eterna aridez das ideias que violentava quem tinha o desejo de mudança, a
integridade dos que viam o mundo e sobretudo o praticavam muito para além do
poder do dinheiro, a mais poderosa arma de Lúcifer contra o medo
inclassificável que lhe era incutido pelo temor a Deus.
A eterna luta entre o Bem e o Mal
iria ser alterada para sempre, sem que os representantes máximos das facções
opostas pudessem controlar essa mudança, que consideravam ora raivosa, ora
despropositada.
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